“Now everything is lost” provém originalmente de uma expressão traduzida e refeita de Aldo Rossi “Dieses ist lange her - Ora questo è perduto” título da gravura de 1975 de Aldo Rossi, composta de várias formas que vão colapsando, evocando uma alegoria sobre o estado da arquitetura, uma alusão ao processo de decaimento, e também a uma nostalgia na representação de uma ideia de perda, um sentido melancólico de reflexão sobre um determinado período de tempo. Em Rossi, a memória é um dos elementos centrais na sua prática projetual, a partir de mecanismos de correspondência e significação; há em Rossi o fascínio pela memória e pelo monumento como representações da identidade cultural.
Uso desta expressão, rearranjo-a para servir o meu propósito, evocando uma ideia de memória, de melancolia, de perda, sobre um assunto que em pouco ou nada se assemelha ao conteúdo original. Faço desta expressão minha, retiro-a do contexto, aplico-a noutro, num ato que remete à ideia de colonialismo e imperialismo, da vontade de absorver outras geografias alheias, com vida própria, reestruturá-las e assimilá-las a uma geografia política distinta. Propõe-se desta forma desafiar a forma normativa como a história é contada.
Escrevo na primeira pessoa, pretende-se com esta posição, trazer um novo sujeito para o centro, falo da periferia e não do centro, deste modo e com estas intenções introduzi o discurso pessoal. Escrevo na margem do lugar de poder de produção de conhecimento, fora do centro.
Grada Kilomba em “Memórias da Plantação, episódios do racismo quotidiano” afirma “O discurso das/os académicas/os negras/os surge muitas vezes como discurso lírico e teórico que transforma a linguagem do saber clássico, um discurso que tem tanto de político quanto de pessoal e poético, como a escrita de Frantz Fanon ou de bell hooks. Deve ser este o principal interesse da descolonização do saber, de modo a permitir que se produza conhecimento alternativo emancipatório, como argumenta Irmingard Staueble, para transformar as configurações de conhecimento e poder e abrir novos espaços de teorização prática (2007:90)”. É sobre esta premissa que esta tese pretende atuar.
Pretende-se desafiar a ideia de representação, tendo sempre consciente as questões de representação enquanto construção de identidade cultural durante o período colonialista, como estratégia política de domínio.
A construção da paisagem é cultural, feita desde os grandes centros de conhecimento da época imperialista da parte dos impérios enquanto autoridade sobre o pretexto de “iluminar” e “humanizar” o Outro subjugado ou mesmo de levar a “Fé” ao outro “não humano”. É sobre este pretexto que a divisão do continente africano pelo Ocidente é exequível. A academia, os centros de produção ocidentais de conhecimento, redefinem a cartografia sob a alçada de uma infinidade de formações discursivas como representações de “outros” lugares e paisagens que veiculam estereótipos sobre os indivíduos, natureza e cultura e as suas geografias imaginárias. Integrando a produção da alteridade, estes valores figurativos nutrem o exercício cartográfico e de mapeamento que irá resultar no processo de colonização. Como confirma W. J. Mitchel:
“A pintura de paisagem no Ocidente, tem a sua origem no século XVII durante o período imperialista de grande parte dos países europeus dos quais a Holanda, França e Itália se destacam. Existe uma ligação temporal entre política interna e ideologia de classes e a representação de paisagem num sentido quase global dentro do discurso imperialista.
À época, a produção da pintura de paisagem poderia não ter uma relação direta com o imperialismo, mas tornar-se-ia uma ferramenta de expressão de posse e domínio.”
W.J.T. Mitchel refere If Kenneth Clark is right to say that landscape painting was the chief artistic creation of the nineteenth century”, we need at least to explore the relation of this cultural fact to the other “chief creation” of the nineteenth century – the system of global domination known as European imperialism.
O colonialismo baseia o seu domínio na criação da alteridade, de uma biopolítica fundada na diferença física e social dos territórios que pretende ocupar.
Esta tese invoca imagens de arquivo da minha mãe, de forma a invocar um novo estatuto destas imagens, e invocar o passado para o presente, sobre um assunto que é ainda pertinente, o da mentalidade colonial dos povos imperialistas.
Pretende-se comparar narrativas e discursos em tempos diferentes, desde 1850 até à atualidade, pondo lado-a-lado memória individual, memória coletiva e história coletiva e entendendo de que forma umas informam as outras, invertendo os mecanismos de poder e dando à “minoria” o controlo do discurso.
Em vez de olharmos a história pela sua periodização, descontinua, plena de diferenças e oposições, períodos velhos que terminam e períodos diferentes/ novos que começam, proponho olhar para a “história” como contínua, mesclada. O facto não existe.
Procura-se relacionar uma memória transgeracional que transmite história aprendida através do testemunho oral à sua inserção - da memória do tempo vivido - na do tempo cósmico.